sexta-feira, 2 de maio de 2008

O que diz o vento.

A vida inteira quisera saber o que o vento dizia. A natureza lhe havia privado deste dom. O som era completamente vazio, para ela. Do vento, apenas uma brisa era sentida. E a manutenção da sensação tátil não lhe servia de consolo. Na verdade era uma forma ingrata de lhe mostrar a outra limitação. Imaginava, sonhava, mas não ouvia.

O amor trouxe a remissão na pessoa do outro. Acaso não era só isso o amor. A realização da pessoa, no outro. Os desejos transferidos e, por isso, realizados. O gosto e o desgosto compartilhados. Por ele soube como eram os sussurros, os cantos, as reticências e os poemas que só o vento sabe trazer. De onde, ninguém nunca soube. Mesmo assim não era real. Não era o seu vento.

Agora, já no apagar das luzes, ela escrevia as últimas vontades. Na verdade a última. Uma única só. Que as suas cinzas fossem jogadas ao vento, num dia de tormenta. Talvez, assim, liberta das limitações naturais, possa, finalmente, ouvir o vento. E esperar, ardentemente, que o seu vento não seja mudo.

4 comentários:

Flávio Dantas disse...

vc que escreveu?
que bonito...

Nanda Nascimento disse...

Nossa Odilon, que lindo! Quanta sensibilidade em suas palavras, comovente!

Beijos e flores!!

Otávio disse...

Que inspiração! Muito bonito.Parabéns!

Mais bonito que os prédios da Marginal Pinheiros.(eheheh)

MARIPA disse...

Que bonito,terno e cheio de sensibilidade este texto!

Esperemos,sim, que o seu vento não seja mudo.

Beijo carinhoso.