A língua portuguesa é uma jóia. Quer pela beleza da formação de sentenças, quer pela sonoridade própria dos termos. Entretanto, independente da erudição e das tentativas de preservação integral da língua, existem alguns vocábulos que, com o passar do tempo caem em desuso. Permanecem como partes da jóia, mas destinadas a um cofre.
Assim como as palavras de carinho se tornam ultrapassadas, também as formas de ofender podem ser datadas. Algumas palavras, extremamente ofensivas em determinados períodos, podem perder a sua força e deixar de ter a utilidade para um xingamento. Podem até soar hilárias, em outros tempos.
Vocês imaginam alguém ofendendo outrem com a palavra pústula. Retire-se, não suporto a sua presença, você é mesmo um pústula! Nos dias de hoje, por mais carregada que seja a entonação, o timbre de voz ou a veemência proferida junto com o termo, ele não tem mais sentido. Ninguém se ofende por ser pústula. Ninguém nem mesmo se preocupa em saber o que é ser pústula.
Da mesma forma, ofensas morais do quilate de piranha, boa-bisca, biscate, para as mulheres ou maricas, peroba e pederasta, para os homens, perderam o sentido. A não ser em brigas de casas de repouso dificilmente são ouvidas em público. A semelhança de pé-de-chinelo ou a sua variante altamente ofensiva pé-de chulé. Quem, nos dias de hoje ousaria proferir um tamanho insulto com estas palavras. O insultado rolaria no chão de tanto rir.
Outros termos devido à forma rebuscada ou desconhecimento do significado nem mesmo guardam o sentido ofensivo de antigamente. Ninguém ousaria descrever algum dos nobres deputados como pérfidos ou publicar uma manchete de jornal, nestes termos - Os representantes do povo, pérfidos e iníquos merecem o vilipêndio dos brasileiros por abjetos que são.
Será que uma senhora ainda se ofenderia se fosse chamada de coroca ou de um caco? Ou seria considerado um assedio moral referir-se a um funcionário como chocho? O que dizer então das ofensas de honra como biltre, cafajeste ou mesmo crápula. Todas sem utilidade.
Como eu nunca fui um ser desagradável, por natureza, não tenho muito a perder com esta situação. Porém imagino aqueles que ficam indignados com qualquer atitude contra a pessoa deles e apelam para injúrias, lançando mão de um poderio verbal ferino. Como devem sentir-se incomodados quando os ofendidos não dão a mínima bola ou manifestam falta de entendimento para os xingamentos. Devem se sentir caducos.