quarta-feira, 31 de outubro de 2007

Confraria literária - quarto capítulo.

Publico aqui a contribuição e continuidade do amigo Otávio. Para acessar a explicação, primeiro, segundo e terceiro capítulos basta clicar nos links.



Quarto capítulo

"Não, não poderia ser ela. A diferença de luminosidade oferecia a certeza de que ela não o havia visto. Caminhando para longe da janela tentou, inutilmente, mais uma vez o telefone. Nada, ia deixar uma mensagem quando soou a batida na porta de carvalho do chalé. Marian estava irremediavelmente em perigo.

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Depois de lentamente tomar os drinques, ela sentiu que começava a relaxar. Uma agradável tontura tomou conta de sua cabeça, achou que já estava na hora de ir para o hotel. Olhou para o lado, sorriu para o jovem casal sentado, extremamente felizes e imediatamente se lembrou de Robert. Ele deveria estar ansioso por uma ligação. Chegou a pegar o celular, mas desistiu. O barulho de música e as conversas do local atrapalhariam.

Pediu a conta ao barman, que prontamente lhe entregou a nota. Levantou, pagou e foi saindo lentamente em direção à porta. Apesar de levemente tonta pela bebida, teve a sensação de estar sendo observada. Sentiu um leve estremecimento. Não, isto não era possível.

A corrida do táxi até o Mercure am Dom demorou apenas minutos. Durante o percurso, observava a cidade sentada no confortável assento do Mercedes que velozmente ia renovando a paisagem. Não gostava de Erfurt. Era uma cidade hostil, germânica demais para seus padrões. Enfim, seriam só três dias.

Cruzando o lobby iluminado, cumprimentou o recepcionista e perguntou se tinha algum recado. Obteve apenas uma negação resmungada. Ao entrar na suíte, ainda no escuro sentiu aquele perfume. Sim com certeza ele estava ali, contrariando todas as probabilidades, aquele perfume o delatava. Sentiu o sangue lhe fugir da face e o corpo novamente se contrair. Era medo, aquele homem lhe causava pânico..."


Agora a bola passa para o ParanoidJ. Sem comprometer a continuidade.

terça-feira, 30 de outubro de 2007

Ícones, quem é esta gente, Roberto?

Hoje vou me deter num comentário do post de ontem. Assim distraio a atenção da amiga mineira que está com cisma de que o escrevente desenvolve plena campanha difamatória contra a imagem do estado natal e de seus habitantes. O autor do comentário é um dos meus melhores amigos, de longa data. No caso dele podemos enfatizar o longa visto que o aparecimento deste senhor quase coincide com a vinda dos açorianos para o Porto dos Casais. São realmente anos de janela.

Mas o post não vai limitar-se a descortesia sobre contagem de tempo. O fio do assunto começa pelo conhecimento musical deste sujeito. É indescritível. Existem gêneros musicais dos quais ele gosta, outros um pouco menos e até alguns que ele desgosta. Porém, sobre todos, ele sabe detalhes que deixariam muitos fãs musicais com complexo de iniciantes. E toda a informação que ele repassa é sempre sem pedantismo, quase didática.

Tá certo que com o passar do tempo o gosto musical foi ficando marcante em relação a um gênero de música um pouco antiga. E com isso a maioria dos intérpretes que ele cita como ícones já não estão mais conosco, para usar um eufemismo. A palavra ícone foi muito bem aplicada com o significado de pessoa emblemática do seu tempo (grifo do escrevente). E este tempo, com certeza, não é muito recente. Não sei se por coincidência, as quatro cantantes citadas teriam, juntas, bem mais de 300 anos. Duas delas já engrossam o coral de anjos do Senhor.

A idade ou o fato de não gravarem com assiduidade não tira o valor de cada uma delas. Inclusive a música tema dos comentários do outro amigo (que parece querer compartilhar os direitos autorais do blog) foi um grande sucesso de algumas. A musicalidade castelhana me inspirou ainda mais. Ao invés de escrever vou gravar um disco.

Alguém se habilita a auxiliar na escolha do repertório?

segunda-feira, 29 de outubro de 2007

Alguns segredos

Todas as pessoas de bom senso têm segredos. E por ter bom senso, estas mesmas pessoas, acabam contando alguns deles quando surge a circunstância favorável para torná-los públicos. Não estou falando daqueles segredos impróprios ou de atitudes sem sentido para o conhecimento comum. Refiro-me às pequenas vontades escondidas por algum motivo especial que, de vez em quando, sucumbe à vontade de compartilhar com os outros.

O fato de começar a escrever com mais constância fez aflorar um destes segredos. Apesar da minha modéstia, tão conhecida e decantada pelos amigos, realmente não julgo que escreva bem. Sei que tenho uma forma peculiar que agrada a alguns. Também reconheço que apresento os assuntos de uma forma prazenteira e divertida. Isso faz com que as pessoas entendam o significado dos textos, na maior parte das vezes. Não há necessidade de muita interpretação. Não desenvolvi a qualidade dos fabulistas.

O vocabulário ajuda na aproximação do público – se assim podemos chamar os poucos amigos que se dignam a ler os escritos. Não é limitado, mas não procura transmitir uma erudição destituída de propósitos. A objetividade cria interesse e contribui para a facilidade de compreensão. E finalmente, a sinceridade não passa despercebida.

Ora o que tudo isto tem a ver com o segredo anteriormente referido? Qual será este segredo que demanda centenas de palavras introdutórias? De alguma maneira deve estar relacionado com o hábito de escrever. Sim, é tempo de tantos quantos se interessarem saberem que tenho um enorme e escondido desejo de escrever em língua espanhola. Isso mesmo, simplesmente prosear em castelhano. Sentar a frente de um teclado e ver as palavras, sentenças e parágrafos assumirem formas próprias do idioma de Cervantes, Borges, Cortazar e tantos outros gênios hispânicos ou latino-americanos.

A língua portuguesa é belíssima e ao mesmo tempo dificílima de ser dominada. Amo escrever em português. Estou sempre aprendendo. Sinto um companheirismo extraordinário nas palavras e na estrutura das frases. Mas, devo confessar que a sonoridade de alguns termos castelhanos e a força de outros me encanta. Algumas palavras significam mais delas mesmas quando nesta língua. Exprimem todo o sentido e potencializam o valor criativo do vocábulo. São especiais. E espero, algum dia, aprender a usá-las bem.

Um segredo a menos na face da terra.

domingo, 28 de outubro de 2007

Ah, a falta de compostura.

Todos sabem que não é do meu perfil comentar notícias, no blog. Mas existem honrosas exceções para as quais se deve estar sempre atento. Há mais ou menos dez dias, uma amiga comentou no seu blog que na minha terra houve uma desatenção em relação ao roubo de um livro de bronze do monumento aos poetas Carlos Drummond de Andrade e Mário Quintana. Chamei atenção em comentário que apesar do ocorrido, o fato demonstrava a cultura até dos ladrões gaúchos.

Pois é o troco veio antes do esperado. Cada estado com o seu destaque.

Ontem o site Terra estampava a manchete - Funcionários de circo são presos por orgia em MG. A notícia informava que cinco funcionários de um circo foram presos pela Polícia Militar, no início da manhã do sábado, na cidade de Contagem, região metropolitana de Belo Horizonte, ao serem flagrados dentro de uma caminhonete D-20 praticando uma orgia sexual.

"Eles estavam na maior sem-vergonhice e alegaram que aqui é uma rua sem saída. Um deles se apresentou como namorado da única mulher e disse que estava tudo bem, mas todos vão ser levados para a delegacia pelo crime de ato obsceno em via pública. Os vidros da caminhonete estavam todos embaçados", informou o militar.

Mui amigo o namorado da moça. Quatro a um, o placar desavergonhado. Se estes fatos acontecem em vias públicas das Geraes, imaginem o que pode estar se passando em lugares mais reservados. O pudor mineiro já não é mais o mesmo. Senhoras de Minas uni-vos. É tempo de uma nova Marcha da Família, agora contra a Libertinagem.

Lamentável, caros leitores. Lamentável


PS – por motivos óbvios a ilustração foi censurada..

sábado, 27 de outubro de 2007

Convencimento

Este é um bom tema para sábado. Antes de pensarem o pior de mim, esclareço que o tema ao qual me refiro não tem nada a ver com o sentido de presunção, soberba ou imodéstia, que a palavra pode ter. Até aceito que esta percepção do termo combinaria mais com um texto do autor, mas vou me deter na acepção de convencimento como ato ou efeito de convencer alguém, sobre alguma coisa.

O convencimento tem um papel importante em algumas profissões e existem técnicas para desenvolver esta capacidade. As atividades comerciais estariam fadadas à extinção se não houvesse pessoas com aptidão específica para convencer os outros das vantagens e utilidades de produtos. Os profissionais que detém ou desenvolvem esta capacidade adquirem um valor inestimável, em determinadas situações. Em outras relações, bem menos associadas às questões comerciais o convencimento salienta-se também como fator, pretensamente, catalisador.

Na maioria das vezes o ser humano tem uma necessidade de que os amigos comunguem de hábitos, opiniões, habilidades, atividades e um sem número de outros interesses. A simples afinidade que este relacionamento determina no campo das idéias, estima e afeição nem sempre é suficiente para dar segurança e estabilidade à amizade. Por isso, há consenso de que se deva aglutinar os amigos em torno de pontos comuns. Até as situações desagradáveis passam a ter uma percepção diferente quando têm a participação de amigos.

Aí que mora o perigo. Quando os amigos não pronunciam, espontaneamente, um desejo ou posição de concordância com os pontos de interesse escolhidos, entra em cena o convencimento. Independente das técnicas e da capacitação de algumas pessoas no exercício do convencimento, eu creio que o resultado deva ser sempre questionado. Qual a certeza de que o consentimento ou aceitação, obtidos pelo convencimento, resultem de uma manifestação da autonomia? Como ter certeza de que não houve constrangimento ou coerção naquilo que encaramos apenas como convencimento?

O processo de tomada de decisão envolve complexos mecanismos relacionados com vivências, crenças, desejos e percepções individuais que podem ser estimulados, positiva ou negativamente, por fatores externos. Os argumentos aplicados no convencimento podem funcionar como reforço para a lealdade e confiança, depositadas na relação de amizade, culminando numa participação voluntária. Ou ter um efeito contrário ao esperado determinando uma aceitação apenas por condições de alienação, submissão, acomodação ou imposição. E os resultados podem ser desastrosos para a amizade, no longo prazo.


PS: o texto, bem como o seu caráter intimista, apesar de aplicáveis não foram motivados pelos acontecimentos de participação na confraria e nem com o desaparecimento voluntário da amiga relapsa, a despeito das tentativas inglórias dos amigos de incluí-la no rol de blogueiros participativos. Acho que é um reflexo da overdose de ética dos últimos três dias. Os circuitos ainda estão funcionando num mesmo canal. Preciso imediatamente escrever sobre grandes bobagens. Socorro, uma piada de loira, na veia.

sexta-feira, 26 de outubro de 2007

Branco e preto


Como num bom filme policial, dos anos 40, estou me sentindo abandonado pelos meus pares. O encontro já deveria ter acontecido. A hora e o local estavam corretos. Não deveria existir descompasso entre o desempenho dos atores e o comando do diretor. Mas me vejo completamente só, no meio de uma ponte semi-destruída, em algum lugar perdido no leste europeu, com a neblina encobrindo o campo de visão e sem dispositivos que permitam tirar proveito da situação. O aspecto noir toma conta da tela. Os magníficos contornos preto e branco definem o plano. Corta!

A missão fora traçada de acordo com o consenso de todos. A participação seria integral. Os estimulantes foram exaustivamente utilizados e as funções determinadas. A marcação de cena fora planejada, apresentada e contribuiria para o melhor desempenho de cada um. A escolha das personagens levara em consideração as habilidades individuais. Os papéis foram escolhidos a dedo. A largada até fora dada com augúrios de sucesso pleno. E, então, era apenas para cada um seguir o script. Não foi o que aconteceu!

Reviso o storyboard para localizar se as seqüências não foram modificadas. Acho que a minha ausência momentânea fez com que eu perdesse algum acontecimento determinante. Não sei e nem desconfio qual. Mas tão determinante que modificou o rumo da estória. O que terá acontecido?

Já sei todos os meus companheiros foram capturados pelo inimigo! A minha missão será, agora, resgatá-los das garras de um terrível embusteiro. O temível bloqueador de blogs. Tenho de evitar, a qualquer custo, que o soro paralisante seja utilizado novamente. Os resultados da primeira aplicação foram claramente favoráveis ao facínora. Ponto para ele. Bloqueio quase total das postagens. Tenho pouco tempo para executar as tarefas da missão. O período, naturalmente entorpecente, do fim de semana se aproxima. Como numa missão impossível tenho poucas horas para reverter a situação. Necessito urgentemente de sinais dos companheiros.

quinta-feira, 25 de outubro de 2007

Entressafra

Em alguns momentos, a capacidade produtiva sofre as conseqüências dos desgastes e atividades estafantes do dia a dia. Nestes períodos é difícil manter a capacidade produtiva em vários frontes. Por mais que possa parecer desvinculada de estresse ou desprovida de compromisso, a tarefa de atualizar o blog pode assumir contornos angustiantes ou de obrigatoriedade.

Quando ou se por acaso este fato acontecer o mais adequado é não se preocupar com a atualização. Ninguém vai ficar impaciente ou sofrer algum tipo de infortúnio se ficar alguns momentos sem ler os textos de qualquer um dos amigos. É mais adequado manter a integridade e tranqüilidade pessoal do que criar uma situação fatigante ou mesmo tediosa de escrever por escrever.

Por isso paro por aqui. Reconheço que este meio de semana não foi dos mais produtivos para o quarteto. Deveria considerar o pai de todos também como sem inspiração? Uma com um cansaço persistente de vários dias, o outro apelando descaradamente para recursos pueris para chamar atenção, a relapsa no auge do exercício dos seus atributos de fugir da raia e o que vos escreve com uma chrise de bloqueio criativo determinada pela saturação de direcionamento para o raciocínio ético.

Dias piores virão. Vamos aproveitar esta simples ausência de superação. Amanhã será outro dia. Talvez o sol apareça e traga consigo a luminosidade que as nossas mentes embotadas estão a precisar. Caso está técnica motivacional rudimentar não dê resultado resta-nos pegar o caminho até Ocean Drive, de carro. Garantias de animação no meio do mar, com direito a festa na passagem do Equador.

Boa sorte, para nós.

quarta-feira, 24 de outubro de 2007

A insustentável leveza

Praga - 2007
Ilha de Kampa

Sigo carregado pelo peso das minhas culpas,
Das desculpas por não estar sempre vivo.
Espio a escuridão com o olho da luz e vejo o passado
Como num documentário de diretor errante
Não reconheço nada
Os fatos sucumbem à memória do esquecimento
Não espero nada
Nem mesmo o dia em que terei de me encontrar

Sigo carregado pelo peso das minhas culpas
E porque esta leveza no coração?

terça-feira, 23 de outubro de 2007

O emagreçedor de Quaraí (2)

Quem conhece bem o doutor sabe que tem duas coisas que não gosta: magreza e castelhano. A profissão explica uma e a proximidade da fronteira a outra. A combinação dos dois me tira do sério. Isoladamente só detesto. Agora, ao causo da baleia gremista.

Não estranhem a designação. Tenho o hábito de apelidar, carinhosamente, as clientes. Tem a orca de Sapucaia, a aliá do Jaguarão, a oleosa de Dom Pedrito e a minha preferida – a picanha uruguaia. Mas vamos ao causo.

Uma tarde, quase na hora de encerrar as consultas me aparece uma portenha. Gorda pelo menos, enorme para ser mais preciso. Não foi pelo sotaque que eu percebi que a dona era da outra banda do rio. A castilhana obesa tem um quê especial. A distribuição de banha é diferente. A paleta junta mais gordura que a anca e a deformidade lembra o corcunda de Notre Dame. Nem pêra, nem maçã. Parecia uma manga.

O trajo da bicha mostrou que ia dar trabalho. Tava toda de azul, branco e preto. Vestido de lamê azul, sapato preto e um lencinho branco no pescoço. Parecia um mosqueteiro. Acho que não sabia que eu sou colorado. Ao entrar na sala desembuchou:

- vim aqui fazer uma dieta.
- buenas, que bom. Comprar seguro de gringa que eu não vou.
- quero ficar com o corpo da Gisele Bünchen.
- coitada nem sabia que a prenda tinha morrido. Mas como não é minha herança pode ficar com ele, sim.
- o doutor não leva nada a sério?
- só a dieta do doutor Atkins. Eta, regime bão. Mata do coração, mas o guasca fica sequinho.

Antes de adelongar a prosa e sentindo que a dona estava impaciente pra tirar a roupa e ser examinada, resolvi passar um tratamento rápido:

- vamos começar pela dieta da munhata. Só batata-doce durante 15 dias. Deve perder umas seis libras. Se resistir volta aqui, mas pede pra Guerda marcar a consulta ao ar livre. Por causa do vento ruim.

segunda-feira, 22 de outubro de 2007

Confraria literária

Como a nossa comunidade de amigos blogueiros está crescendo!

Com a nova adesão de PI, passamos a ser quatro. Isto sem contar o pai de todos. Aquele que surgiu quando ainda existia o chaos. Nem havia luz sobre a face da terra, para nós, e ele já blogueava. E desde o estrangeiro.

Para comemorar este recorde a sargentona do grupo propôs uma atividade. E eu, como operário qualificado, fui incumbido de começá-la. A atividade consiste da formação de um texto em conjunto entre os blogueiros amigos. Uma manifestação literária a várias mãos. Inicialmente um de nós escreve uma parte do texto que será continuado por outro, que será continuado por outro ...., até a sua finalização. Independente de quantas voltas der e do tamanho do texto. A criatividade será o limite. Aquele que escrever o texto deve escolher um amigo para continuar o texto.

Para organizar a suruba escrevente teremos algumas regras:

1. não pode furar, o jogo é que nem vaca amarela!
2. não vale apelar pro palavrão e baixaria explícita,
3. a continuidade deve ter sentido
4. quem receber a tarefa deve copiar o texto anterior e complementar
5. prazo máximo de 2 dias para resposta
6. não criar dificuldades para o próximo
7. a tarefa pode contar com blogueiros e comentaristas

O título de cada texto será a última tarefa do grupo. Batismo depois do nascimento. Um por todos e todos por um!

E foi dada a largada, agora é só sucesso.

“ Sentado no escuro, ele imaginava o que aconteceria no dia seguinte. Várias possibilidades passaram pela sua cabeça numa fração de segundo. Algumas sem o menor sentido. Outras, primariamente elaboradas, esbarravam na realidade. Ele já sabia o final. Qual um exercício de cubo mágico tentava encaixar outras possibilidades de arremate para a sua própria história. Não devia pensar sobre isto agora. Na verdade não adiantava pensar nisso agora.

Inconscientemente levantou-se e foi até a janela. O vento, que soprava do lago, já estava frio nesta época do ano. A janela aberta permitia que ele visse uma parte da represa. As águas mansas refletiam a serenidade da natureza. O luar lembrava um rastro de prata. Acendeu um cigarro. Sorveu como se estivesse inspirando um ar fresco. A fumaça, embalada pelo vento, formava estranhos desenhos.

Para afastar os pensamentos indesejáveis, movimentou levemente o corpo. Para a direita, para a esquerda. Aquela sensação nas costas ainda estava lá. Procurou fazer alguns exercícios de alongamento buscando um alívio, mesmo que temporário, da dor. Inclinando o corpo um pouco para frente avistou a curva da estrada, no final do ancoradouro. Imediatamente notou uma luminosidade familiar. Era um farol de um carro. “

Escolho PI para continuar a estória.

PS: já surgiram diversos nomes para este exercício. Mandem mais sugestões. Como devemos chamar esta coisa que estamos fazendo? Enviem para mim que eu listo e publico para todos os envolvidos.

Resgatando La Fontaine

Nos dias de hoje a maioria das pessoas é tão direta que não deixa dúvidas do que está dizendo. O politicamente correto sepultou a metáfora. Todos ficam com receio da leitura nas entrelinhas ou da interpretação que pode ser dada ao texto. Em seqüência a reflexão vai pro brejo. Saudosa época das fábulas. O por trás do escrito tinha valor, mesmo quando a moral da estória tivesse de ser apresentada com todas as letras no final do texto.

No post de hoje presto uma homenagem a um dos grandes fabulistas do passado - La Fontaine. Na verdade este senhor acrescentou uma pitada de ironia a uma temática não original, visto que as suas fábulas são atualizações de Esopo (aquele amigo que o Roberto já referiu num comentário). Esta fábula, já publicada anteriormente, é uma criação livre inspirada no autor francês. Digamos que pode ser classificada como La Fontaine-like (utilíssimo este anglicismo – tudo o que a gente quiser plagiar é só descrever como like). Como homenagem incluo a imagem do inspirador no post.


"Um velho sapo estava ao sol perto da lagoa quando viu uma bela lagartixa nova passa, requebrando a cintura. Percebendo que talvez esta fosse uma das últimas oportunidades de saborear um pitéuzinho tão tenro e delicioso, o velho sapo desejou ardentemente que a lagartixa viesse ao seu encontro. Mentalmente bolou um plano rocambolesco para conseguir a lagartixa. E já antevia o seu sucesso. Já podia sentir o troféu sendo usufruído. Neste momento surge um sapo novo, pulando de pedra em pedra, e salta em cima da lagartixa. Num instante o troféu foi pro beleléu e o sapo novo, com a tarefa cumprida, seguiu o seu caminho.


Moral 1: sapo velho não come lagartixa nova.
Moral 2: não basta querer tem de fazer.
Moral 3: sonhos são sempre sonhos pra quem só sabe sonhar."

Boa semana para todos.

domingo, 21 de outubro de 2007

Remembrância

autoria desconhecida

No comentário sobre o post do dia 19 de outubro (completamente infame) o meu amigo Roberto aplicou uma palavra que os dicionários ainda não descobriram – remembrância. O vocábulo surgiu de uma expressiva fusão do verbo em inglês to remember + infância.

Mesmo depois de criados, os termos necessitam de um processo para sua difusão. Uma possibilidade moderna seria a criação um meme sobre o significado, significância e percepção individual da remembrância e, no final, computar o conteúdo semântico que o signo lingüístico provocou nos escreventes. Outra forma, mais ortodoxa, seria propor a inclusão do verbete em tesauros e dicionários. Qualquer uma das escolhidas não impede que manifestações pessoais, em defesa do neologismo, sejam postadas.

Não tenho nenhum apreço pela manutenção da língua como uma entidade semi-viva. Não me parece correto que apenas os filólogos ou lexicógrafos detenham o poder de indicar novos termos ou discorrer sobre a origem dos mesmos. Os usuários da língua têm a obrigação de torná-la mais disponível para a sua função. Esta obrigação não inclui, exclusivamente, simplificações gráficas dos termos lingüísticos, tão em voga nos escritos juvenis. Deve-se optar pela criação de novas palavras. Com cautela e funcionalidade transparente.

A empatia com remembrância foi imediata. O termo é sonoro. O significado quase natural. A escolha da fusão foi acertada. Imaginem que palavras poderiam surgir se a escolha dos termos de fusão incluísse lembrança + childhood. Os resultados seriam lembhood ou childrança. O primeiro, com sonoridade duvidosa, remete a uma infância germânica plena de proibições e segredos (já imagino um livro sobre A lembrhood de Eva Braun). O segundo, então, nem de longe sugere lembrança infantil. Lembra mais um castigo infantil ou dança de roda.

Conclamo todos os colegas blogueiros para a inclusão do termo no seu rol de verbetes. Para incrementar a sua difusão sugiro a seguinte descrição no Dicionário Houaiss:

Remembrância
Datação
2007


Acepções
Substantivo feminino
ação ou efeito de lembrar(-se) de ocorrências infantis
1 aquilo que acontece à memória na evocação da infância
2 aquilo que subsiste, a despeito da amnésia infantil freudiana

Etimologia
neologismo fusional anglo-lusitano
remember + infância

Se alguém estiver interessado em dar continuidade com a difusão através de meme, sinta-se à vontade.

A assunção da coletividade – participação em meme?

Ontem recebi o desafio (ou seria convite?) do meu amigo Guilherme para participar de um MEME - basta pegar o livro mais próximo de você, abrí-lo na página 61 e transcrever o 5o. parágrafo. Nem foi preciso me espantar com o meu desconhecimento do termo porque ele mesmo questionou, definiu e publicou esclarecimentos. Restava a decisão de aderir ou quebrar a corrente memética, que havia começado em outro blog. O momento foi de reflexão. Há poucos dias parecia inimaginável participar de algo coletivo na blogosfera (quanta pretensão!).

O fator que impediu a participação imediata não está ligado à culpa por atrapalhar um exercício alheio ou ao receio de um castigo digital desconhecido. Devo confessar que esta última possibilidade preocupou-me um pouco, pois recentemente tive a minha privacidade rastreada em nome do esclarecimento da origem da publicação do comentário de uma tal Lola. Com direito a conto de fadas e tudo. A dúvida era se a tarefa deveria ser executada com objeto real ou poderia utilizar o imaginário. Grito por socorro e as vozes se calam. Permaneço com a dúvida, mas resolvo responder sem questionar o sentido:

Real – Tragédia da Rua da Praia: uma história de sangue, jornal e cinema, de Rafael Guimaraens. “Mais um detalhe, delegado. Quando interrogados, eles se declararam anarquistas, revelou o repórter Mario Almeida, fazendo um gesto para que Louzadinha confirmasse. Na verdade um deles fez questão de se dizer anarquista e demonstrou profundo conhecimento das teorias revolucionárias.”

Imaginário – A chrise no âmbito do feminino – o gineceu florescido, Margot La Perge. “A identidade com o feminino ocorre independente da vontade. A negação inicial das limitações que esta identificação impõe, determina um processo de adaptação involuntário, precedido pelo questionamento dos valores arquetipicos. O compreender a feminilidade parece, em princípio, natural às mulheres. Desta singularidade simplificadora eclode o motivo fundamental da chrise de individualidade de gênero. A conscientização da perda da voluntariedade gera uma incerteza da autonomia primordial e provoca a sensação de uma obrigatoriedade perene.”

Finda a tarefa, tenho uma proposta. A impossibilidade de escolher outros blogs para continuidade da tarefa determina a proposta. Que tal se agora cada um dos envolvidos escrevesse sobre o texto do outro. Reforço do processo de aprendizado pelo exemplo. Aguardo posicionamento dos outros desafiados. Vou sentar e esperar a participação do Dr. J.

sábado, 20 de outubro de 2007

A virtude atabafada – a infâmia

Ora deveis estar vos perguntando por que e como alinhar infâmia à virtude? Ao longo desta descrição tereis apresentadas algumas justificativas para a consideração da infâmia como a virtude encoberta.

A associação regular, porém imprópria, do termo infâmia apenas com ignonímia e vergonha, reforça o caráter pejorativo que o social impôs a despeito do componente filosófico indicar uma orientação menos indigna. Por que considerar a infâmia uma virtude? Virtude é uma força que age ou detém a capacidade de agir. Desde Aristóteles repete-se que a virtude é uma disposição adquirida voltada para o bem, independente do uso que dela se faz. Quais as características de beneficência presentes na infâmia?

A infâmia seria a virtude relacionada à perda da fama. Não só como conseqüência da desonra ou do descrédito imputado pelo meio. A digna representante de uma ação voluntária ao encontro do processo de anonímia. A opção pela ausência de celebridade. O afastamento precípuo da necessidade do reconhecimento. O despojamento da veleidade de ser superior.

Neste contexto a infâmia em conjunto com a misericórdia e a temperança formariam o triângulo de sustentação do estoicismo. A aceitação resignada do destino e a completa extirpação das paixões atingiriam seu apogeu na busca da sabedoria. Aquele que abdica da fama dá um grande passo em direção à sabedoria, que há de mostrar-lhe o valor da ausência da fama. Fecha-se o círculo vicioso da moderação do saber com prudência e humildade.

Os infames têm o poder de construir uma estima moral e difundi-la, eticamente, através do exemplo. Praticar esta virtude remete a escolha pela mediocridade e a cicatrização da ferida narcísica estimulada pela espetaculosidade atribuída a si pelos seus pares. O infame é antes de tudo um forte. Tem a coragem de assumir a perda da fama como fator agregador e de sociabilidade. O destaque deixa de ter um valor intrínseco e cede o lugar às vantagens do reconhecimento da igualdade.

sexta-feira, 19 de outubro de 2007

Passatempo

Mais um dia sem inspiração. Acho que vou fazer greve de blog até o blog-irmão começar a produzir. Ou melhor, lembrar de passatempos infantis. Esta é a solução.

Aguentem!

O rato roeu a roupa do rei de Roma e a rainha da Rumênia, roída de raiva, roeu o rabo do rato.

Lá no muro, lá no muro tem um pequeno bicho. Olhem só o bicho, vai pular no lixo, lá no muro, lá no muro tem um pequeno bicho.

Estava a velha em seu lugar, veio a mosca lhe fazer mal. A mosca na velha e a velha a fiar;

Estava a mosca em seu lugar, veio a aranha lhe fazer mal. A aranha na mosca, a mosca na velha e a velha a fiar;

Estava a aranha em seu lugar, veio o rato lhe fazer mal. O rato na aranha, a aranha na mosca, a mosca na velha e a velha a fiar;

Estava o rato em seu lugar, veio o gato lhe fazer mal. O gato no rato, o rato na aranha, a aranha na mosca, a mosca na velha e a velha a fiar;

Estava o gato em seu lugar, veio o cachorro lhe fazer mal. O cachorro no gato, o gato no rato, o rato na aranha, a aranha na mosca, a mosca na velha e a velha a fiar;

Estava o cachorro em seu lugar, veio o pau lhe fazer mal. O pau no cachorro, o cachorro no gato, o gato no rato, o rato na aranha, a aranha na mosca, a mosca na velha e a velha a fiar;

Estava o pau em seu lugar, veio o fogo lhe fazer mal. O fogo no pau, o pau no cachorro, o cachorro no gato, o gato no rato, o rato na aranha, a aranha na mosca, a mosca na velha e a velha a fiar;

Estava o fogo em seu lugar, veio a água lhe fazer mal. A água no fogo, o fogo no pau, o pau no cachorro, o cachorro no gato, o gato no rato, o rato na aranha, a aranha na mosca, a mosca na velha e a velha a fiar;

Estava a água em seu lugar, veio o boi lhe fazer mal. O boi na água, a água no fogo, o fogo no pau, o pau no cachorro, o cachorro no gato, o gato no rato, o rato na aranha, a aranha na mosca, a mosca na velha e a velha a fiar;

Estava o boi em seu lugar, veio o homem lhe fazer mal. O homem no boi, o boi na água, a água no fogo, o fogo no pau, o pau no cachorro, o cachorro no gato, o gato no rato, o rato na aranha, a aranha na mosca, a mosca na velha e a velha a fiar;

Estava o homem em seu lugar, veio a mulher lhe fazer mal. A mulher no homem, o homem no boi, o boi na água, a água no fogo, o fogo no pau, o pau no cachorro, o cachorro no gato, o gato no rato, o rato na aranha, a aranha na mosca, a mosca na velha e a velha a fiar;

Estava a mulher em seu lugar, veio a morte lhe fazer mal. A morte na mulher, a mulher no homem, o homem no boi, o boi na água, a água no fogo, o fogo no pau, o pau no cachorro, o cachorro no gato, o gato no rato, o rato na aranha, a aranha na mosca, a mosca na velha e a velha a fiar.

quinta-feira, 18 de outubro de 2007

Ode a São Lucas

Hoje é o dia do médico. Impossível esquecer esta data. Primeiro porque sou médico. Segundo por ser filho de uma carola inveterada que ao invés de canções de ninar contava estórias de santos. A cada dia um santo e um martírio diferente. Comemorações litúrgicas. Por um distúrbio da personalidade, presente desde a tenra infância, o sono vinha antes do flagelo do pobre do santo. Não são desta época as minhas memórias do campeonato de arco e flecha de Sebastião ou do pão e circo dos mártires primeiros da igreja. A única vaga recordação refere-se ao dia de São Lucas, Evangelista, discípulo de Paulo Apóstolo e médico - 18 de outubro. Talvez pela simplicidade da estória. Na época gostava da representação, só bem depois vim a lucrar com a data e receber homenagens.

Neste dia as lembranças foram exclusivamente para o lado profissional. Todos os méritos focaram no ser e estar médico. Isso que cortei o cabelo, usei perfume novo, apareci com o terno Armani que custou uma fortuna e botei a gravata de legítima seda francesa (presente de uma parabenizável também) evocando a primavera na Provance. Nada foi suficiente para desviar a atenção do qualitativo medicinal. Nenhum elogio para qualquer outro diferencial. Devo ter passado por mal-arrumado, mal-cheiroso, mal-engravatado ...mas Médico. O consolo é que restam todos os outros dias para notar as demais qualidades.

A todos que lembraram da data, obrigado.
Aos que não lembraram, obrigado também.
Amanhã tudo volta ao normal.

PS: pelo título devia ser um poema lírico em homenagem ao santo e não uma apologia a minha pessoa. Misericórdia!

Diálogo entre insones

A notícia da possibilidade de utilização do peixe, conhecido como paulistinha, em modelo animal para estudos de genética dos distúrbios do sono, motivou uma blogueira concorrente escrever sobre a companhia que este “próximo bichinho” poderia fazer nas suas noites de insônia. Imaginou-se trocando idéias com ele e criando uma amizade. E o solícito esposo já está planejando a ativação de um aquário.

Antes de iniciar um papo amigável certifique-se do sexo do seu companheiro de insônia, pois ele pode ser determinante na escolha dos assuntos. Imagine passar as noites discutindo sobre esportes aquáticos, novas formas de produção artesanal de uma bebida à base de alga fermentada (tirada com ou sem colarinho) ou se as fêmeas de vertebrados aquáticos valorizam ou não o tamanho da barbatana.

Discorra sobre as maravilhas e vantagens de possuir um blog. Já pensou se ele se estimula? Mesmo que as limitações de informática possam não parecer óbvias, o desempenho de digitação pode ser comprometido pelas nadadeiras. Sempre existe a possibilidade de abrir um blog no lugar do paulistinha e publicar textos como ghost-writer, até que ele desenvolva um processo de postagem mais eficaz e que não dependa de ação manual – quem sabe comando de voz. Tenho uma sugestão para o nome. Que tal – Osteichthyes, eu vi! O risco é que ele assuma o seu próprio blog antes de outro amigo.

Assuntos profissionais também podem estar restritos. Afinal as competências e habilidades necessárias para a sobrevivência ou saliência profissional são muito diferentes num meio fluido e num meio denso, como o que estamos acostumados. Inteligência de mercado? Existem estudos que mostram claramente a presença de inputs inteligentes em vertebrados apesar da utilidade e aplicação destas relações serem ainda muito discutível frente às possibilidades limitadas de ação no meio. E não se pode esquecer que, talvez, esta última palavra traga recordações desagradáveis em relação à espécie.

Quem sabe falar de amenidades – sobre o tempo, por exemplo. Tá certo que o referencial será um pouco diferente. Não é esperado um alinhamento estreito nos conceitos de umidade relativa do ar. Muito cuidado com a entonação quando se referir ao tempo chuvoso, poderá parecer ofensivo para o paulistinha, principalmente se a conotação for de desagrado. Afinal manifestar descontentamento por água para um peixe pode ser considerado uma afronta.

Os assuntos de beleza estão liberados desde que não incluam aspectos de ressecamento da pele ou dicas de maquiagem para a escolha de sombras e delineadores, totalmente sem sentido para um pobre animalzinho fadado a viver cercado de água e com os olhos bem abertos. Vantagens do rímel escuro ou branco? Nem pensar.

Um tema perfeito seria alimentação. Afinal com a revolução da culinária moderna passamos a conviver com, e apreciar, pratos com algas, plânctons e demais microorganismos marinhos. Ponto para o paulistinha que poderá lhe ensinar muitas formas de preparar estes componentes. Isto, uma boa opção é passar a noite trocando receitas com o paulistinha.

quarta-feira, 17 de outubro de 2007

Decisões ousadas

Primavera. O sol brilhava de uma forma diferente. A brisa convidava para um passeio no campo. A colméia era um alvoroço só. Operárias iam e vinham buscando néctar das flores para a fabricação do mel. A rainha estava no período fértil. Os zangões exibiam-se como símbolos sexuais à espera da escolha. Mal sabiam da fatalidade. No meio desta confusão uma jovem abelhinha preparava-se para a sua estréia. Já passara pelo período de treinamento teórico e estava apta para o desafio. Era consenso que fora uma das melhores da última turma. Aprendia rápido. Estava ansiosa pela prática. Sentia-se preparada e confiante.

Às flores!

Com um impulso rápido abandonou a colméia. O que se descortinou a sua frente era deslumbrante, superava em muito as imagens do treinamento. O mundo era infinitamente mais bonito ao vivo. Avistou um canteiro de amores-perfeitos e, num vôo rasante, abocanhou o primeiro néctar. Ulalah! Rapidamente passou para as rosas, margaridas, miosótis, dálias, gerânios. O cheiro das flores funcionava como um estimulante para continuar a jornada. Um a um os canteiros foram visitados. Cada vez mais rápido procurava suplantar o que havia apreendido. Queria ser a melhor de todas.

De repente a surpresa. Onde estava? O que era isso? Pareciam sóis. Do miolo enorme partiam raios imensos que balançavam levemente ao vento. Apesar da confiança, as dúvidas começaram despontar. Não se lembrava de nenhuma descrição de algo semelhante. Mentalmente recordava todos os ensinamentos. Mesmo em conversas informais na colméia nenhuma das colegas referira-se a isso. O odor parecia de flor, apesar da deformidade o volume lembrava uma flor. Mas com todo aquele tamanho? Era diferente de tudo o que lhe haviam ensinado. O medo começou a se apossar da abelhinha. Onde seria a central do néctar? Não tinha idéia por onde começar. Também não queria desistir e se transformar em pilhéria das outras abelhas quando voltasse. Mas conseguiria sair depois de realizada a tarefa?

Numa fração de segundos pensou em desistir. Era estreante, tinha até o direito. Não seria a primeira a falhar. Não, não desistiria. O desafio era arrebatador. De olhos fechados mergulhou ao encontro do seu destino.

E descobriu que era apenas uma flor grande.

terça-feira, 16 de outubro de 2007

TV Piratini - Canal 5

Neste fim de semana, por força de um ser mais forte que eu – um vírus – estive limitado de circular ou manter minha atividade ligada em 220 volts. A indisposição foi tamanha que até impediu de ficar no computador. Abrir os olhos, sorrir e refletir tornaram-se tarefas árduas. Neste embotamento mental, pensei até em assistir televisão. Ao invés de assistir viajei no tempo recordando os primórdios da TV.

Sim, eu não sou de antes da TV, porém acompanhei o seu início na minha terra. Aqui em São Paulo já existia há algum tempo, mas na época (uma amiga ri muito quando digo que eu nasci antes da cadela Laika ser enviada para o cosmos com o Sputnik II) as novidades tecnológicas demoravam a ser difundidas. O investimento era, proporcionalmente, muito maior e necessitou de indivíduos visionários para levar esta novidade aos quatro cantos do país. E as minhas origens ficam exatamente em um destes quatro cantos – o canto sul. Outros dirão que era mera conseqüência da falta de lavagem de dinheiro.

A programação da televisão seria inimaginável para os padrões de hoje. Não havia nenhuma, friso bem NENHUMA novela. No lugar o teleteatro. Peças teatrais eram encenadas com atores e cenários teatrais. Eram apresentados textos de Shakespeare, Dostoievski, Ibsen e outros estreantes na mídia. Toda a programação era ao vivo, mas não em cores. Não havia ainda o vídeo tape, modernidade que estaria disponível apenas em 1959.

A imagem era em preto e branco ou melhor, em tons de cinza. Em algumas casas existia o hábito de colocar papel ou plástico com as cores do arco-íris para oferecer um aspecto colorido à imagem. O horário era limitado em poucas horas no ar. O sistema de captação de sinal ocorria através de uma antena interna e uma das soluções para diminuir a interferência na captação de sinal era a colocação de tufos de Bombril (acho que esta era a uma das mil e uma utilidades) nas pontas.

Ao longo da programação havia inserção de reclames dos patrocinadores. Estas propagandas consistiam em slides com texto fixo e fundo musical sofrível. Ao final era citada a produtora responsável por este primor – Produções Behar. Com a evolução surgiu a garota-propaganda. Mulheres bonitas, para o padrão da época, ficavam estanques ao lado dos produtos a serem anunciados recitando o texto. Algumas cometiam a ousadia de movimentar-se no estúdio ou pegar os produtos – o que nem sempre era bem visto pelos patrocinadores. Lógico que neste âmbito errar custava o emprego.

A jóia desta corroa de recordações gostaria de dividir com todos. O nome do programa era Pradinho Sinimbu (patrocínio da indústria de cigarros do mesmo nome) e consistia em imagens semelhantes a cavalos de corrida e jóqueis – como marionetes - que se alinhavam para uma corrida de cavalos. A cada páreo no Jóquei Club do Rio Grande do Sul entrava uma narração radiofônica e os cavalinhos se movimentavam de acordo com a narração até a finalização do páreo.

E os aparelhos de TV... bem, isto fica para a nossa próxima atração.

segunda-feira, 15 de outubro de 2007

Sobre flores e comidas

Eu não saberia escrever sobre flores e comidas. Não que não goste delas ou que aceite tratarem-se de temas proibidos ou desafiantes. Apenas não tenho afinidade. Se escrevesse não pareceria real. Seriam meros escritos sobre assuntos não familiares. As pessoas notam quando os assuntos não fazem parte de um autor. Os adjetivos são exagerados, os verbos ficam sem ação e os substantivos não ficam tão substantivos assim. Por isso sempre espero que alguém que tenha estas afinidades opte por escrever sobre assuntos, com os quais não tenho familiaridade, e produza textos agradáveis.

Ouvi dizer que o amigo de uma amiga minha gosta de flores e comidas. Até estaria disposto a escrever sobre elas, mas uma particularidade da sua personalidade está impedindo, ou apenas retardando, este exercício. Como os amigos e, por extensão, os amigos de amigos têm a obrigação de estimular o exorcismo de demônios internos e libertar criaturas dos seus medos, incito o amigo a escrever. Se a dificuldade estiver em começar, ofereço algumas dicas: escolha uma flor ou uma comida que te agrade, personalize esta entidade, permita que ela troque confidências contigo e te indique o que dizer dela, alguma particularidade que só tu tenhas percebido. Mostre aos outros esta cumplicidade com o tema e todos apreciarão. Vamos lá, desembucha amigo. As pessoas merecem escutar, ler ou saber o que tu tens a dizer. E elas não te perseguirão. Não por isso.

domingo, 14 de outubro de 2007

Nada, coisa nenhuma, inspiração zero.

Hoje é domingo. Primeiro dia do horário de verão. Uma hora perdida. Um dia nublado, acinzentado, mormacento e pesado. As idéias parecem girar na cabeça e não se encaixam no lugar certo. Penso em escrever sobre diversos assuntos – Lula 2014, o mapa astral de crianças nascidas na primeira hora do horário de verão, fidelidade partidária, a politicagem na escolha do Nobel – mas nenhum deles me inspira. Não fluem. Será que até eu estou tendo uma crise frente a uma folha em branco?

Para vencer esta situação recorro a uma estratégia singular. Não escrevo sobre nada. O tema passa a ser a falta de tema. As dificuldades de não saber por onde começar. Alguns solucionam esta questão escrevendo sobre a definição original do bloqueio criativo. Outros optam por discorrer sobre as vantagens metafísicas de escrever sobre o nada. O nada holístico. O nada cósmico que se reflete num profundo nada existencial. O nada que preenche as lacunas deixadas pelo próprio nada.

Eu prefiro somente não falar de nada. Sem assunto. Posso até listar diversos motivos para o sucesso de não escrever sobre nada. A falta de comprometimento com um assunto específico. A medida certa para os comentários – que afinal também serão sobre nada. E sobre as culpas que advém de estar discorrendo sobre o nada. O conflito interno de associar a sua produção ao nada.

E ao fim, mesmo não escrevendo nada no papel em branco, tenho um texto. Este aqui. Para um domingo, no início do horário de verão, mormacento, no final de um feriado prolongado, com parte dos leitores viajando, até está muito bom, não está?

Escrever sobre nada é melhor do que não escrever nada.

sábado, 13 de outubro de 2007

Instantâneos paulistanos (2)

Manhã de um sábado ensolarado. Parece que os deuses se juntaram para enviar um dia especial de primavera. Os pássaros cantavam, as flores exalavam um agradável perfume e a luminosidade parecia saída de um quadro impressionista. Entro na padaria Xodó Paulista (na Ministro Rocha Azevedo – não estou ganhando nada pela propaganda). As atendentes, apesar de estarem trabalhando neste dia radiante, procuravam encantar os clientes. Na minha frente uma moça, de idade indefinida, semblante carregado, parecia impaciente esperando o atendimento.

- bom dia! Em que posso ajudá-la?
- me vê dois pães de nozes. Tô com pressa.

A atendente pegou um pão de torresmo, que estava em cima do de nozes, e a cliente replicou ríspida:

- o que está fazendo? Eu não quero de torresmo. De nozes, não escutou?
- eu preciso tirar os pães de cima para chegar aos de nozes.
- então vai rápido que estou atrasada.

A atendente pegou os tais pães de nozes e começou a retirar a etiqueta com o preço. Neste momento a cliente quase saltou para dentro do balcão, de tanta irritação:

- o que você ta fazendo com os meus pães, menina?
- estou tirando as etiquetas.
- eu não pedi, retrucou a cliente.
- se eu não retirar pode haver registro duplo de preço.
- como vocês têm um sistema confuso. Me dá logo este pão.
- tenha um bom dia e volte sempre, respondeu a atendente.

Sinto pena destas pessoas para quem até um te amo soa como grosseria.

sexta-feira, 12 de outubro de 2007

Dia das crianças

A infância não deveria ter preocupação, para todas as crianças. Nesta fase não se desenvolveu a capacidade de entendimento do mundo real, o controle da própria manutenção é proporcionado por terceiros e a responsabilidade pelos atos cometidos é minimizada. Somente na loucura se conquista novamente estas três condições. Infelizmente nem sempre a realidade corresponde aos desejos. Algumas crianças, muito cedo, perdem alguma destas características infantis, senão todas. E com isso deixam de ser crianças. Permanecem pequenos, porém não mais crianças. É que a perda destas condições compromete a fantasia infantil que, em essência, é o que diferencia a criança do adulto.

Ganhei muito com a imaginação na infância, minha ou dos que me cercavam. Nada de muito ficcional, elaborado ou futurista. A fantasia me proporcionou momentos simples e inesquecíveis: a pata que fumava, no mini-zoológico do Parque da Redenção; a catarata na boneca Floriana, que exigiu uma complexa cirurgia ocular; os encontros com o amigo imaginário (doutor Astarita) que obrigava o pai a abrir os braços e soltar o pequeno na cama mil e tantas vezes, sempre como uma novidade; a caçada ao leão em plena praça Maurício Cardoso; a venda de abacates e muitas outras estórias. Elas foram uma parte da realidade infantil que não esqueci. Talvez tenham deixado marcas profundas pois ainda viajo na fantasia. Mesmo agora, na vida adulta - ou um pouco mais dirão alguns – ainda me permito períodos de alucinação quase infantil. A minha parte criança ainda necessita de fatos próprios. Gosto da fantasia e procuro inseri-la no meu dia a dia, ainda. Não confundo com a mentira e nem me deixo levar pelos fatos imaginários. Mas me satisfaço quando ela aparece. É muito bem-vinda. E, com ela, crio novos momentos inesquecíveis.

Por isso, a todos,
Parabéns pelo dia das crianças!

Salve rainha!

Aos fiéis e romeiros e principalmente a minha amiga Anunciatta,
a imagem milagrosa de
Nossa Senhora da Conceição Aparecida.

Rogai por nós!

quinta-feira, 11 de outubro de 2007

O engolidor de "is" (1)

Pobre László. Desde a infância tinha o sonho de triunfar. O treinamento fora espartano nestes anos todos. Mas, atualmente, a sua não era uma atividade muito apreciada no showbizz. Não tinha apelo comercial. Como os empresários diziam, não agregava valor. Se ao menos fosse fogo, ou vidro ou cobras e lagartos. Mas, ora vejam que habilidade simplória: ele era apenas um engolidor de “is”. Independente de ser bom ou não, a sua apresentação resumia-se a engolir publicamente “is”.

Houve tempo que o profissionalismo era muito maior e a atividade valorizada. Os bons tempos da escola magiar de engolidores de “is”. De lá saíram Vilmos Stupetek, Istvan Egger e o professor de todos, Sandor Dvorak. Jamais haverá outro engolidor de “is” igual. O mestre arrebatava multidões em todos os locais em que se apresentava. São antológicas as suas performances no Budai Vigadó, no verão de 43 e no Gran Circus Magyar, na season 47-48. Em uma única apresentação engoliu mais de 26 “is”. A fama espalhou-se pelos quatro cantos do mundo. O seguro de sua garganta atingiu valores semelhantes ao das pernas da Dietrich, das mãos do Rubinstein e dos seios da Mae West.

Infelizmente, apesar do desejo ardente, Sandor não conseguiu entrar para o Guiness World Records. Morreu moço durante uma experiência, mal sucedida, de degustação de um “ç”. Como não tinha familiaridade com a letra, a cedilha entalou no divertículo de Zenker. Morte súbita – lesão irreversível do esôfago. A viúva recebeu uma boa grana. Para o seguro o ocorrido foi considerado como acidente de trabalho. Pagamento dobrado. A semelhança do lobo mau, na história do chapeuzinho, quando abriram o estômago, durante a necrópsia, encontrou-se restos de material não digerido - uns 100 “is”. Ainda nos dias de hoje, na data deste trágico acidente, 23 de maio, uma multidão deposita flores aos pés da sua estátua, na Mátyás tér, em Budapest.
E por que László havia escolhido logo esta manifestação artística? Fora realmente uma escolha ou haveria um mistério associado a esta decisão?

quarta-feira, 10 de outubro de 2007

Aniversário

Fazer aniversário é muito simples. Depois de 365 dias da última comemoração ocorreria a próxima. Constante e inexorável como as estações do ano, o dia e a noite, a rotação e a translação. Quase um fenômeno cosmológico. E a soma destes acontecimentos produziria uma vida. Desta forma as datas de aniversário ganham importância pelo simbolismo próprio de uma renovada comemoração à vida. A revelação dos votos de continuidade, porém num novo ciclo.

Como manifestação de louvor à vida, as datas de aniversário têm sido acompanhadas de “sinais exteriores de felicidade”. Bolos, festas, presentes, bebedeiras, brigas em família, demonstrações explícitas de inveja e ciúme fazem parte, voluntariamente ou não, de algumas formas de celebração. Mesmo com esta simplicidade franciscana e simbolismo explícito, algumas pessoas preferem um recolhimento interior nestes momentos. Gostam e vibram muito com a data. Mas declinam do ato público em seu favor. Comemoram reservadamente. E nós, os amigos, temos a obrigação de apoiá-las integralmente.

Temos, mesmo? A consciência às vezes nos aponta caminhos que nem sempre concordam com as decisões alheias. Nestes momentos temos de fazer uma escolha: o respeito contrito ou o gracejo puro? Eu fiz a minha opção. Gente vamos estourar balões, vestir chapéus de palhaço, soprar línguas de sogra, enviar milhares de comentários e cantar muito alto e desafinado - Parabéns, pra você... nesta data querida...

Feliz aniversário, Otávio.

terça-feira, 9 de outubro de 2007

Desencontros trigonométricos

Desde o princípio aquela relação não tinha entrado nos eixos. O referencial cartesiano foi insuficiente. Ele não abria mão da aplicação da trigonometria esférica no dia a dia e ela, estimulada pelos conceitos geodésicos, teimava em considerar falsas as soluções propostas. O amor até que existia, mas a soma do quadrado dos interesses individuais era, substancialmente, maior do que o quadrado da hipotenusa, considerando a hipotenusa como a linha que unia os pontos de interesses comuns. Os planos eram arbitrários e não apresentavam área de intersecção. A saída era pela tangente. A complementaridade inicial, que lhes rendera o apelido de seno e co-seno já ia longe. A bissetriz não dividia partes iguais. Cada um ansiava por ser maior. As distâncias tornavam-se infinitas e as equações, criadas para resolver os problemas, já não demonstravam corretamente os fenômenos básicos da convivência.

As projeções não passavam pelo mesmo meridiano. A persistência do paralelismo era flagrante. Não havia ponto comum no infinito. Uma completa ausência de convergência. A base AB e CD não indicavam o mesmo azimute. Os cálculos das prioridades não eram coincidentes. Nem mesmo o vislumbre de um triângulo esquentou a relação, pois cada um calculava os motivos e conseqüências pelo seu ângulo. Os graus de inquietação careciam de identidade. Dois pesos e duas medidas. Ela acusava a ele de ser obtuso e ele revidava com um sarcasmo agudo. Um e um não atingia mais resultado. Estavam fadados a seguir trajetórias sem sentido, direção ou vértice comuns. C.Q.D.

segunda-feira, 8 de outubro de 2007

O emagrecedor de Quaraí

Por alguma razão ainda não completamente explicada, de uns tempos para cá, os médicos gaúchos passaram a exercer um fascínio na clientela de todo o Brasil. Inúmeros são os exemplos de profissionais vindos do sul com destaque em diferentes segmentos da área da Saúde. Da cirurgia plástica a pesquisa molecular, da cardiologia a medicina ortomolecular e, principalmente, na área diagnóstica.

Alguns médicos nem precisam se deslocar do rincão natal para fazer sucesso. Assim foi com um analista e agora será com um artesão da redução de peso. Sim emagrecer é uma arte. Pelo menos é o que podemos entender da sua definição – arte é a atividade ligada a manifestações de ordem estética por parte dos seres humanos. Pronto, as técnicas de emagrecimento expressam contornos artísticos e os endocrinologistas tornaram-se artistas.

No desempenho de suas atividades ajudam a esculpir e moldar corpos, modificando formas e volumes na proporção do desejado. Ao invés de blocos de mármore ou outros materiais resistentes trabalham com outras substâncias modeláveis, que ocupam lugares indesejados no espaço. Nesta dimensão a endocrinologia torna-se irmã da escultura.

Oigalê-tchê, este texto já tomou um rumo muito erudito. E como diz o colega analista, erudição é coisa pra invertido. Voltemos ao que interessa: o emagrecedor de Quarai. Apesar de todo sucesso ainda clinica numa tapera, perto do cerro do Jarau. O mesmo local que serviu de cenário para a lenda da Salamanca. A relação entre os fatos não vai se aclarar nesta conversa. Vamos primeiro conhecer a ficha do bagual. A história fica, também, pra depois.
Nome: tanto faz, gosta mesmo de ser chamado de doutor e pronto.
Local de nascimento: se orgulha de ser de Bagé, mas não usa o título para não ser confundido com o outro.
Formação acadêmica: estudou medicina na capital. Doutorado em Medicina espacial. Autodidata em endocrinologia – o que sabe de dieta aprendeu com a vida.
Linha de tratamento: não tem, linha é coisa pra bonde e telefone velho.
Lema: gordo é tudo igual, só varia o volume.
Artista preferido: Fernando Botero (por razões óbvias)
Amuleto: uma réplica da Vênus de Willendorf, que não sai de cima da mesa de trabalho e serve de ameaça para as renitentes em começar o tratamento – ela era que nem tu, mas não seguiu os conselhos do médico dela.
Traje: bombacha e alpercata Roda (das legitimas argentinas).
Horário de atendimento: amplo, atende emergência e pra china bonita até à noite.

domingo, 7 de outubro de 2007

A Festa da Sopa Seca

Como homenagem a uma grande amiga patrícia, Maria Emília, transcrevo alguns comentários sobre uma tradição pouco divulgada, mesmo em Portugal. Trata-se da Festa da Sopa Seca, que se realiza a cada ano, no primeiro domingo de outubro, coincidindo com a comemoração litúrgica de Nossa Senhora do Rosário (7 de outubro). Estas informações provém de diversos sites e de notícia publicada no Jornal de Notícias, no dia de hoje. Aproveitem.

"Sobremesa tradicional nas vindimas de Penafiel, a sopa seca é um pitéu único no país, confeccionado na maioria das casas da freguesia de Duas Igrejas. A Freguesia de Duas Igrejas fica situada a Oriente da cidade de Penafiel, apenas a 3 km, ocupando uma área de cerca de 6 km2, e tem como padroeiro Santo Adrião. Até aos meados do século XIX, era conhecida por Canas de Duas Igrejas. O acontecimento festivo mais importante é a festa de Nossa Senhora do Rosário, que se realiza todos os anos, no primeiro domingo de Outubro, e é também denominada por “Festa da Sopa Seca”, por ser uma característica distintiva e que a liga a uma tradição multissecular que se perde na noite do tempo, mas cuja origem se radica, segundo testemunhos orais e que se transmitem de geração em geração, no hábito que tinham as famílias mais humildes e de parcos recursos económicos, de prepararem uma sobremesa que estivesse ao alcance das suas bolsas e que satisfizesse as suas aspirações gastronómicas.

Doce à base de pão de trigo velho e água com limão, acompanhado com vinho doce, ainda pouco divulgado nos roteiros da gastronomia nacional. A iguaria típica desta localidade tem o segredo de ser confeccionada em forno a lenha e há quem pense que a sopa seca é um caldo. Era a sobremesa dos pobres! Com o andar dos tempos, esta tradição radicou-se nos hábitos alimentares do povo desta freguesia e hoje, com uma confecção mais requintada, deu origem a este “pitéu gastronómico”.

Instantâneos paulistanos (1)

Manhã de domingo, antes das oito horas, avenida Paulista. Caminho com um amigo. Para manter a forma (mais a dele do que a minha que nem está precisando muito). Somos interrompidos por um casal que pede uma informação. Gente simples, que não sabe bem onde está, desconhece as vizinhanças. Procuram a Pro Matre. Na pressa ou por falha de compreensão, quase indico o caminho para o Santa Catarina. Em tempo o amigo corrige e eles não perdem tempo e nem chego a ficar com remorso. Como complemento do agradecimento, a mulher informa com evidente emoção e contentamento – a minha nora vai ter um bebê. Paro e reflito. O nascimento de uma criança ainda comove e alegra pessoas. Que bom se fosse sempre assim. Que Deus abençoe esta criança!

A cripta de Santa Eulália

Sárcófago de Santa Eulália
Catedral de Barcelona


Às vezes a falta de inspiração faz com que a gente escolha textos interessantes, de outras pessoas ou fontes, para inserir no blog. Acho que este é um destes momentos. Curtam esta interessante informação da wikipedia:

" La cripta esta situada bajo el presbiterio y su construcción se debe a Jaime Fabre, a principios del siglo XIV. La entrada por una amplia escalera bajo un arco casi plano, ornado en el centro con el retrato de un obispo, parece ser de Ponç de Gualba, bajo cuyo mandato se construyó, y a sus lados grupos de pequeñas cabezas de personajes de la época, en los muros laterales de la escalera se encuentran dos arcos con esculturas de testas humanas, que eran la entrada a dos capillas tapiadas en el año 1779 por unas obras de remodelación para adelantar la escalinata hacia el altar mayor.La bóveda aplanada está dividida en doce arcos que van todos a converger a una gran clave de bóveda central, que representa, la Virgen María con el Niño Jesús que le coloca la diadema del martirio a Santa Eulalia. Fue terminada en 1326, aunque el traslado de los restos de la santa, no se hizo hasta 1339.

El nuevo sarcófago de alabastro, lo labró el escultor de Pisa, Lupo di Francesco, se encuentra expuesto tras la mesa del altar, en el centro de la cripta, sostenido por ocho columnas de estilos diferentes con capiteles corintios dorados. En la tapa y sus lados están talladas escenas del martirio de Santa Eulalia, en los cuatro ángulos superiores hay ángeles-lámpara y en el centro una Virgen con Niño. Se guarda en la pared del fondo su antiguo sepulcro del siglo IX, junto con la inscripción del año 877 del hallazgo de las reliquias en Santa María del Mar llamada Santa María de las Arenas. La transcripción de las placas dice así:

Aquí reposa Santa Eulalia mártir de Cristo, que sufrió en la ciudad de Barcelona, bajo la presidencia de Daciano, el dia segundo de los idus de febrero y fue encontrada por el obispo Frodoí con su clero, en la iglesia de Santa María el (...) de las calendas de noviembre. A Dios gracias "


PS: ops! acho que errei a mão na escolha do texto, da língua e da propriedade do dia.

Num dia de domingo

Diferentemente de algumas pessoas eu sempre gostei de domingos. Sem apelos religiosos ou trabalhistas. Para mim a modorra que os domingos trazem é revigorante. Uma certa dose de apatia é muito boa. Deixar-se levar sem compromissos. É um dia especial para que os pensamentos se acomodem e ocupem os seus espaços, desordenadamente. Enquanto estamos indolentes eles se ajustam sozinhos.

A maioria das pessoas que não curte o domingo gostaria de ter uma agenda executiva para este dia. Diversas atividades para preencher o vazio de todas elas. E evitar o levante dos pensamentos. Nem sempre é gratificante ficar a sós com eles. Alguns são muito truculentos. Pegam pesado e insistem em ter prioridade. Para afastá-los não adianta balançar a cabeça e mistura-los com outros. Bater a cabeça na parede também não é a melhor solução!

Mansamente tente argumentar com eles. Sorrateiramente inicie uma negociação. Se isso ... aquilo. Lembre que talvez eles não sejam, em essência, ruins. O momento pode estar inadequado. Negocie tempo, freqüência de aparecimento, periodicidade e se for necessário até intensidade. Planeje um dia inteiro para eles. Quem sabe um feriado todo. Finados? Mas tente livrar o domingo dos pensamentos indesejáveis.

Se a técnica de negociação não surtir efeito, seja pela grosseria do inimigo ou pela sua total incapacidade de negociar. Utilize a técnica de saturação. Pense exaustivamente neles durante um bom tempo. Permita que eles cresçam, agigantem-se até que eles mesmos não se agüentem mais. Como num passe de mágica, eles vão querer acabar. Ninguém consegue conviver eternamente com a dificuldade. Tenho certeza que se a loucura não lhe dominar antes, estará livre destes pensamentos.

Caso nenhuma destas ações surta efeito... tente a fuga. Ligue a televisão. A anestesia bestial determinada pela programação dominical das redes de televisão não permite que nenhum ser, inferior ou superior, pense. É tiro e queda! Adeus qualquer pensamento. A única dificuldade é que a dose pode ser exagerada. E eles ficarem ausentes até o meio da semana. Mas isto será tema de outra conversa.

sábado, 6 de outubro de 2007

Desconsolo

Desconsuelo (1907)
Parc de la Ciutadella - Barcelona

Como dizia o poeta:
Assim é e assim seja...

No longo silêncio que me imponho
Clamo desesperadamente pelo eco, que não soa
Busco insistentemente o grito interior, que se cala
No longo silêncio que me imponho
Já não consigo ser parte da infelicidade do mundo
Crio a minha própria
Que me basta!

Escolha o seu, eu vi!

Meninos, eu vi. Guris, eu vi!

A mudança de nome do blog e a associação com as origens do escrevente suscitaram especulações sobre a multiplicidade de denominações que este poderia ter . A diversidade de situações determinaria uma infinidade de variações sobre o mesmo tema.

Uma das vantagens da imaginação é que o seu produto não tem, necessariamente, uma relação direta com os fatos reais. A minha sugestão é de que cada um imagine o apelido mais apropriado para este espaço.

Garotusssss, eu vi! para os cariocas da gema (que termo mais antigo),
Piás, eu vi! para os catarinenses e paranaenses,
Miúdos, eu vi! para os lusitanos,
Mininos, eu vi! para os com sotaque,
Moços, eu vi! para os tradicionalistas,
Crianças, eu vi! para as educadoras, em geral e tias, em particular.
Infantes, eu vi! para os pedantes.

E outras denominações peculiares, que espero ver nos comentários.

Para não ser acusado de discriminação de gênero - meninas, gurias, moças, miúdas, infantas, garotas - todas quantas forem as denominações femininas - eu vi!

Ou simplesmente,
Gente, eu vi!

PS: espero que gostem do novo visual.

sexta-feira, 5 de outubro de 2007

Pequenas digressões


A maioria das pessoas que me conhece classificar-me-ia como um cavalheiro. Sem pretensão. Não costumo perder a calma, procuro ser gentil na maior parte das situações, escuto as pessoas e me interesso pelo que escuto, respeito a opinião dos outros e outras qualidades afins.

Hoje tenho de confessar que uma faceta negra da minha personalidade veio à tona. Cometi uma digressão, afastei-me do prumo. Escrevi no blog de uma amiga um texto explicitamente machista. Hediondamente machista.
Não que eu me arrependa. Isto é apenas uma confissão.

A razão dessa falta de arrependimento é simples. Todas as pessoas, de vez em quando, podem e devem cometer algumas digressões leves, faz parte da natureza delas. Isso pressupondo que as pessoas têm um compromisso intrínseco em serem boas e só algumas vezes saírem dos trilhos. Por isso, esta mensagem não serve para os aprendizes de cafajeste, cafajestes completos ou pós-graduados em cafajestagem.

O cometimento de pequenas digressões contribui para manter afastados os apelos desastrosos dos desvios ferrados da personalidade, neuroses brabas e psicoses marcantes. Nada de transbordar o copo com a gota que faltava. Com isso evita-se a criação de um caldeirão de bruxas que culmina fatalmente em grandes catástrofes, crimes e desvios de conduta.

Pequenas maldades, mesmo causando algum mal-estar podem bloquear pecados maiores e manter os ânimos em patamares de belicosidade bem mais baixos. A mesma teoria da válvula das panelas de pressão. Uma questão meramente física.

Como não fui muito machista, não vou me arrepender. Peço desculpas.
Mas não me arrependo. Quero continuar normal.

quinta-feira, 4 de outubro de 2007

A metáfora da rosa


O por do sol já havia passado.
Ao longe os braços da noite fugiam dolentemente por trás das cores do arco-íris.
A escuridão cismava em não aparecer.
O rompimento do pacto de dia-após-noite-após-dia-após-noite parecia inevitável.
A catástrofe avizinhava-se, célere como o tempo. Prenúncio do canto de Nix.
O pio da coruja matadeira já soara. Involuntariamente lúgubre.
O som rasgava o silêncio como uma sirene macabra.
Agora era só esperar. Não tardaria a aparecer o feitiço da morte.
Mas quando se esperava que o cheiro do enxofre tomasse conta dos fins do mundo, o aroma da rosa se fez sentir no ar. Inebriante e fugaz como o sopro da criação.
E a noite caiu.

Corrente de amigos


Existem poucas coisas tão gratificante como ter amigos.
Em contato pessoal, virtual, espacial ... a forma não interessa.

Demonstrar amizade deveria ser um dever primordial dos humanos.
Se bem que algumas vezes os animais conseguem expressar de forma mais explícita o prazer de compartilhar gostos, espaços e interesses.

Como devo ser um privilegiado... a minha corrente está crescendo!

Vamos lá, amigo, amiga, amiga dos amigos, amigo das amigas, amigos dos amigos, outros amigos, de outro amigo que não conheço ....

É muito bom ver todos vocês aqui!
Mesmo os que ainda não são amigos.


quarta-feira, 3 de outubro de 2007

E o congreço faz susseço.


Notícia publicada hoje pela Folha on line dá conta que, durante um período, alguns documentos do Congresso Nacional tiveram estampado um carimbo com grafia equivocada. Nele a palavra Congresso aparece com ç. Ora vejam, Congreço!

Independente dos reais motivos que culminaram nesta trombada com a língua portuguesa este fato permite um delírio..... lingüístico? Os versados que me perdoem, mas sempre tive problemas em compreender as sutilezas diferenciais entre os termos língua, linguagem, lingüística e seus derivados. Não foi por falta de esforço ou método aplicado no aprendizado pela minha grande amiga e fonoaudióloga Kátia.

Se o termo foi mal empregado, substituam pelo correto, mentalmente, durante a leitura (delírio da linguagem, delírio da língua – embora este último me soe um pouco chulo). Mas como o delírio não tem nada a ver com a falha cognitiva do escrevente, vamos aos fatos.

A palavra congreço deveria existir.
Só para o seu quase homônimo brasileiro. Em que sentido?
Pois vejamos, o dicionário Houaiss indica que a palavra congresso (na sexta acepção) pode ter o significado de intercurso sexual, união carnal. Isso mesmo, igual àquela expressão muito usada como interjeição exclamativa, como desabafo e que não fica bem escrever neste blog familiar. Assim proponho que o tal carimbo permaneça e que todos os documentos sorrateiros ou desvinculados de interesses nacionais continuem identificados com ele.

Apenas um carimbo será suficiente?

Afinal, as situações em que o Congresso esteve envolvido nos últimos tempos permitem um desabafo grosseiro:

É congreço mesmo, mermão!

terça-feira, 2 de outubro de 2007

Rebatismo


Para quem não notou, o nome do blog mudou.

As razões para este fato poderiam ser resumidas numa lista extensa.
Dois foram os fatos preponderantes:
primeiro a sutil sugestão do premiado peregrino Guilherme,

e segundo a existência de um blog com o antigo nome.

Nada do descrito até agora muda.

As idéias são permanentes, os nomes vãos..
Afinal o colega bardo já colocou nos lábios da doce Julieta

uma sentença de morte para a importância dos nomes:

“... Que há num simples nome? O que chamamos rosa, sob uma

outra designação teria igual perfume. Assim Romeu, se não tivesse
o nome de Romeu, conservara a tão preciosa perfeição que dele é
sem esse título...”.
William Shakespeare - Romeu e Julieta, ato II cena II.

Outra grande virtude é que o nome atual contempla as origens

do autor e, em parte, não discorda dos versos publicados
no primeiro post. Tenho certeza que se Gonçalves Dias fosse
gaúcho e o chefe indígena Guarani a finalização, certamente, seria:

Guris, eu vi!

Nem sempre concordo comigo

Jardí d'Aclimatació - Barcelona (2007)

Nem sempre concordo comigo,
Algumas idéias assumem vida própria
Crescem e tomam forma, independente da minha vontade,
Juntam-se aos sonhos e zombam dos meus outros pensamentos.
E como me dá trabalho arrebanhar estas mentiras,
Sem que elas se instalem definitivamente
Nos endereços das verdades.

Por isso penso e existo, como sintonia
Não como conseqüência
De uma falácia cruel, que me leva
A duvidar do pensamento e da existência.


segunda-feira, 1 de outubro de 2007

Tudo começou como uma brincadeira

Brumas Galegas - Guilherme Mazza

Sempre gostei de escrever. Durante um tempo, já longínquo, até tive o hábito de escrever. Com os anos, as outras atividades, a indolência, a acomodação foram contribuindo para a escassez deste exercício.

Até que surgiu uma oportunidade de escrever comentários, no blog do marido de uma amiga minha (parece letra de música antiga do Roberto Carlos). Na verdade não foi bem uma oportunidade. Talvez o termo oferecimento seja mais pertinente. Um oferecimento descabido que hoje eu classificaria de egoísta.

O premiado era um peregrino, que trilhava o caminho de Santiago de Compostela. Ora, quanta petulância! Ocupar espaço no blog de um desconhecido. Como o envolvido, preocupado com o seu próprio desafio, não manifestou contrariedade, surgiu o Amigo da Chris. Esse era o pseudônimo rocambolesco (argh!) de quem vos escreve.
O redator medíocre, mas com uma vontade hercúlea de contribuir, começou a despontar. Os comentários foram se multiplicando. O caminho não teve mais volta. Pelo menos o meu. É, minha gente, a farsa assumiu ares de verdade e peguei gosto.

Que este espaço sirva para continuidade da brincadeira.
Ou como campo de revanche. Guilherme assuma o seu papel.